Vítimas de crime brutal eram tio e sobrinho. Eles foram achados mortos e com sinais de tortura, dentro do porta-malas de um carro.
Por G1 BA.
As lembranças de como o jovem Yan Barros era com a família e amigos não saem da cabeça da dona de casa e autônoma Elaine Costa, mãe do jovem. "Era um filho muito amoroso, carinhoso e ria com tudo", conta.
Yan foi morto junto com o tio, Bruno Barros, após os dois furtarem carnes de um supermercado de Salvador. Os corpos deles foram encontrados na mala de um carro, na localidade da Polêmica, na capital baiana, na noite do dia 26 de abril. Vinte dois dias antes, no dia 4 de abril, Yan estava feliz com a família em celebração pelos 19 anos que acabara de completar.
Elaine ainda lembra as comemorações do aniversário de Yan e o momento em que familiares e amigos ficaram acordados — no dia 3 de abril — à espera da meia-noite para desejar os parabéns ao jovem.
"A gente passou o aniversário dele na Ilha [Itaparica], só a família. Ele estava muito animado, brincando com todo mundo", relembra Elaine.
Em um vídeo gravado por familiares, Yan brinca: "Vamos deixar de barulho e comer logo o bolo? Amanhã de manhã quero comer um hambúrguer", disse. [Veja acima]
Com a chegada de um novo ano, Yan também desejava a concretização de sonhos. A mãe conta que ele cursava o 9º ano em um projeto de Educação de Jovens e Adultos (EJA) pela tarde e fazia o curso de música no Projeto Axé, pela manhã. No tempo livre, queria gravar vídeos e atuar na internet.
"Ele dizia que queria ser youtuber", revela a mãe.
O sonho de Yan precisou ser adiado porque o celular dele quebrou em janeiro deste ano, conforme relata a mãe.
Apesar disso, Elaine conta que Yan não desanimava, seguia divertido e companheiro de todos da família. Ao G1, ela compartilhou uma foto do filho que encenou ser um príncipe para brincar com uma das primas.
"Ele sempre foi brincalhão e carinhoso com todos. Nessa foto aí ele era o príncipe e tinha que dar o beijo para a princesa, a priminha, acordar. Aí ele deu um beijinho na testa dela. Esse era Yan", conclui.
Moradia compartilhada
Yan é o segundo dos quatro filhos de Elaine. A autônoma mora com duas filhas, uma de 17 e outra de 12 anos. Desde os 18 anos Yan morava com o tio, Bruno Barros, que também foi morto após o furto das carnes. Uma parte da família mora em Fazenda Coutos, mas em imóveis diferentes. Entretanto, todos mantinham contato.
Moravam com Yan e Bruno, o filho mais velho de Elaine, de 21 anos, fruto de outro relacionamento da dona de casa. O imóvel onde eles residiam era da mãe de Bruno, avó paterna de Yan, que precisou deixar o local após infiltrações e problemas estruturais. A casa havia ficado vazia devido à necessidade de reforma, mas segundo familiares, Bruno se separou da companheira e precisou ir morar no imóvel.
"A avó dele [Yan] precisou sair da casa onde morava porque precisava de uma reforma, Bruno foi morar nessa casa e ia ficar lá enquanto reformasse. Meu filho mais velho foi também, Yan quis ir e me disse: 'mainha, vou morar com meu tio'", conta Elaine.
A mãe do jovem diz que tentou entender a decisão do filho e pediu que ele permanecesse no imóvel onde residia com a mãe e as duas irmãs mais novas.
"Implorei tanto, não queria de jeito nenhum porque o lugar dele era aqui. Mas ele foi para ficar mais perto da menina que ele namorava aqui no bairro. A nossa casa é mais distante da dela do que a casa que o tio estava morando. Quando estava aqui em casa, ele tinha que ir lá umas duas, três vezes na semana, mas se morasse perto, poderia estar sempre com ela", detalha.
Elaine disse que o namoro terminou em 2020, mas Yan preferiu continuar na casa do tio.
Bruno Barros, tio de Yan
"Meu amor, meu filho era igual a um passarinho. Todo mundo brincava, dava risada com ele. Não tinha uma pessoa aqui na rua aqui que não gostasse dele", conta Dionésia Pereira Barros, mãe de Bruno e avó de Yan.
As lembranças de ambos ainda estão nas memórias da dona de casa, que revela sonhos com o filho, sente saudades dos gestos carinhosos do neto e ainda relembra a morte deles.
"Eu não pude reconhecer o corpo de meu filho e meu neto do tanto que o rosto deles estava machucado. Eu choro porque é muita dor a morte. Eu sonho com ele o tempo todo e não consigo lembrar o que é, só sei que sonhei", conta emocionada.
Dionésia diz que tenta achar uma resposta para a forma como Yan e Bruno foram mortos. Diz ainda que com o anoitecer, não quer barulho e só sente vontade de dormir. Ela ainda prevê como será o primeiro Dia das Mães sem o filho e o neto.
"E tenho outro filho, o pai de Yan. Mas perdi o meu caçula e não vou ter direito a ter um Dia das Mães completo. Eu vou deixar meu celular descarregar, vou tirar o chip, eu não quero receber mensagem, nem ligação de ninguém. É uma dor muito grande”, revela.
A dona de casa diz que a dor tem sido maior porque estava em um processo para ajudar o filho a ter uma renda. Bruno estava desempregado e não conseguia emprego. A mãe então, pensou em colocar uma barraquinha de frutas e verduras para que ele pudesse trabalhar.
"A gente já tinha falado com o rapaz que ia vender a barraca. Na semana antes dele ser morto, a gente já estava acertando tudo, não só para ele, pra Yan também, que queria tirar a habilitação para trabalhar", conta Dionésia.
Bruno deixou uma filha de 12 anos.
Investigação
Familiares e amigos de Bruno Barros, 29 anos, e Yan Barros, 19, denunciam que os seguranças do estabelecimento entregaram os dois, que são tio e sobrinho, a traficantes do bairro do Nordeste de Amaralina depois do crime, no dia 26 de abril. Uma testemunha presenciou a situação.
Segundo a delegada, familiares das vítimas estão sendo ouvidas, assim como funcionários do estabelecimento e testemunhas. A delegada informou que funcionários estão entre os investigados, mas que não pode detalhar o caso para não atrapalhar as investigações. Ninguém foi preso até a última atualização desta reportagem.
A família dos dois homens relata que um deles enviou áudios pedindo dinheiro para pagar carnes que eles teriam furtado de um supermercado.
Por meio de nota, o grupo Atakadão Atakarejo informou que reitera o comprometimento com a observância dos direitos humanos e com a defesa da vida humana digna, não compactuando com qualquer tipo de violência.
Disse ainda que é uma empresa séria, sólida e cumpridora das normas legais, que possui rigorosa política que não compactua com qualquer ação criminosa. Em relação aos fatos ocorridos em 26 de abril, o grupo está colaborando integralmente com a investigação policial e já entregou todos os documentos e imagens do sistema de segurança aos órgãos competentes para o esclarecimento do caso.
A empresa ressaltou que repudia veementemente qualquer tipo de violência e se solidariza com a família das vítimas neste momento tão difícil. O grupo aguarda o encerramento das investigações, que correm em segredo de justiça, para a elucidação do caso e espera a punição de todos os culpados.
Entenda o caso:
Na noite do dia 26 de abril, dois homens foram achados mortos na localidade da Polêmica, em Salvador. De acordo com a Polícia Civil, eles foram torturados e atingidos por disparos de arma de fogo. À época, a polícia informou que a motivação do crime estava relacionada ao tráfico de drogas.
Um dia depois, na terça-feira (27), eles foram identificados como Bruno Barros e Yan Barros. Na quinta-feira (29), a mãe de Yan, Elaine Costa Silva, revelou que ele foi morto após ter sido flagrado pelos seguranças do supermercado Atakarejo por furtar carne no estabelecimento.
Segundo ela, o tio de Yan, Bruno, que também foi morto, enviou áudios a uma amiga informando o que tinha acontecido e pedindo ajuda para não ser entregue aos traficantes do Nordeste de Amaralina.
Na sexta-feira (30), parentes e amigos dos dois homens fizeram uma manifestação, na rua onde eles moravam, em Fazenda Coutos, e depois na frente do Atacadão Atakarejo, que fica no mesmo bairro.
Em nota, o Ministério Público da Bahia informou que ao tomar conhecimento do fato envolvendo Bruno Barros e Yan Barros, adotou as providências cabíveis nesta fase preliminar de apuração, autuando uma notícia de crime e encaminhando ao Núcleo do Júri da Capital.