Custos com ração, adubos e combustível devem diminuir em relação ao início do ano e estimular uma desaceleração da inflação dos alimentos, afirmam especialistas. Porém, gastos com insumos continuam altos em relação a 2021.
Por Paula Salati, g1.
A inflação dos alimentos deve desacelerar no segundo semestre, puxada, principalmente, por uma redução de custos agropecuários com ração, adubos e combustível, avaliam especialistas ouvidos pelo g1.
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Contudo, o arrefecimento de preços deve ser lento e apenas em relação ao início do ano. Na comparação com o ano passado e com o período pré-pandemia, ainda está mais caro para produzir no campo, o que também tem reflexo sobre o consumidor.
Além disso, a queda do poder de compra da população continua limitando gastos e a tendência é que o brasileiro não sinta alívio no bolso.
Em resumo, especialistas afirmam que:
- a desaceleração dos preços dos alimentos será puxada pela queda da cotação do petróleo, que influencia o valor dos combustíveis e fertilizantes (adubos);
- por outro lado, os fertilizantes vão continuar mais caros em relação a 2021;
- produtores de soja, milho e carne conseguem amenizar peso de custos pelo fato de lucrarem em dólar, com a exportação;
- já quem cultiva arroz, feijão e verduras está importando gasto em dólar e faturando em real – panorama que pode desestimular esses cultivos;
- valor do leite deve começar a ceder a partir de setembro;
- carne vai continuar cara por causa da forte exportação.
Alívio no preço das matérias-primas
O recuo da inflação dos alimentos no segundo semestre deve ser puxado pela queda do preço do petróleo no mercado internacional, avalia a economista Gabriela Faria, do setor de análise de agropecuária na Tendências Consultoria.
"O preço do petróleo é um importante balizador dos custos agropecuários. Com menores preços de petróleo, por exemplo, os preços dos combustíveis baixam, o que, por sua vez, reduz o custo do produtor com transporte", diz Gabriela.
A cotação do petróleo também influencia os preços dos fertilizantes (adubos), que são usados para produzir grãos, que, por sua vez, viram ração para bois e aves em criações comerciais.
Desaceleração lenta
Apesar disso, a tendência é de um recuo lento na inflação dos alimentos, diz André Braz, economista da FGV.
Um dos motivos tem a ver com o ciclo de produção da pecuária leiteira. No início do ano, muitos produtores abateram vacas por causa dos altos custos de produção. Já com a chegada do inverno – que provoca seca –, a qualidade das pastagens piorou, reduzindo a disponibilidade de alimentos para os animais.
Tudo isso diminuiu a captação de leite no Brasil e gerou um aumento de preços do produto e de seus derivados, que devem começar a ter uma desaceleração a partir de setembro.
"É um cenário que leva um tempo para se normalizar. Pelo menos até o final de agosto e início de setembro, quando é esperado um retorno das chuvas, o volume de captação do leite deve se manter baixo", diz Braz.
Outro fator é a guerra na Ucrânia iniciada pela Rússia. No final do mês, os dois países assinaram um acordo para permitir que Kiev volte a exportar grãos. A medida pode arrefecer o valor do trigo no mercado internacional e seus derivados.
"Mas ainda estamos em um momento atípico, de grande incerteza. Não é porque as exportações [de trigo] retomaram que há um ponto final nessa questão. Isso porque a guerra ainda não acabou", diz Braz.
Custo com fertilizante ainda é alto
O começo da guerra, no final de fevereiro, também assustou os produtores brasileiros, que dependem dos fertilizantes russos. O que se viu, no entanto, foi uma continuidade do comércio entre Brasil e a Rússia, apesar de atrasos naquele período.
Em relação a março – quando as cotações do adubo atingiram o seu pico –, os preços dos fertilizantes recuaram. O preço da ureia, por exemplo, caiu 21% em julho, enquanto o do fosfato diamônico diminuiu 16,5%.
Por outro lado, na comparação com o mesmo período de 2021, o preço dos dois fertilizantes registra uma disparada de 148,2% e 68,2%, respectivamente, segundo dados consolidados pelo professor da FGV Agro, Felippe Serigati, com base em índices do Banco Mundial.
O custo alto dos insumos acaba sendo diluído, porém, em atividades que têm uma alta produtividade e que lucram em dólar a partir das vendas das exportações, como é o caso da soja e do milho.
"O volume de sementes e fertilizantes que está sendo comercializado [entre os produtores brasileiros], neste momento, está bem forte. O que me sugere que o pessoal está se preparando para uma bela safra 2022/23", acrescenta.