Remédios como ibuprofeno, aspirina, nimesulida e diclofenaco são alguns que devem ser evitados por elevar o risco de um quadro hemorrágico; veja as alternativas seguras
Você já deve ter percebido que, no fim do comercial de alguns remédios na televisão ou no rádio, é reproduzida uma rápida mensagem que diz: “este medicamento é contraindicado em caso de suspeita de dengue”. Mas, especialmente no momento em que o Brasil vive uma alta importante da doença, você sabe dizer quais são esses remédios e por que eles devem ser evitados nestes casos?
Primeiro, é preciso entender que existem duas formas de dengue: a clássica e a hemorrágica. A mais comum provoca sintomas como febre alta repentina, dor de cabeça, prostração e dores musculares e/ou articulares e dor atrás dos olhos. No entanto, em cerca de um a cada 20 casos, segundo informações do Instituto Butantan, ela pode se desenvolver para a forma mais grave.
Nesse caso, dor abdominal intensa, sangramento nas gengivas ou nariz, vômito persistente, às vezes com sangue, e presença de sangue nas fezes são alguns dos sinais de que o quadro evoluiu para a forma hemorrágica. O problema de alguns medicamentos, embora seguros no dia a dia, podem ampliar esse risco de sangramento durante uma infecção pelo vírus da dengue.
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Quais os remédios não pode tomar com dengue?
Esses medicamentos, explica a doutora em Ciências Farmacêuticas pela Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI) e divulgadora científica (@alemdafarmacologia) Ana Elisa Gonçalves, são aqueles que pertencem à classe chamada de anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), que envolvem analgésicos e antitérmicos comuns encontrados em farmácias sem a necessidade de receita médicas.
Alguns conhecidos são o ibuprofeno; o cetoprofeno; o ácido acetilsalicílico (aspirina e várias outras formulações); o naproxeno; o piroxicam; o diclofenaco; a nimesulida e a indometacina. Além disso, explica a especialista, os corticoides, como prednisona, prednisolona, dexametasona e hidrocortisona, também são contraindicados.
— Esses medicamentos têm um efeito colateral que é uma atuação no funcionamento das plaquetas, que são células responsáveis pela coagulação do sangue. Quando temos uma lesão, precisamos da coagulação para não ter um sangramento, uma hemorragia. Só que a dengue é uma doença viral que pode gerar quadros hemorrágicos justamente porque o vírus pode destruir as plaquetas e causar lesões em vasos sanguíneos. Então, quando já há essa ação do vírus, o uso conjunto desses medicamentos vai piorar a atividade das plaquetas e levar a um risco maior de hemorragia — diz a farmacêutica.
Gonçalves complementa que medicamentos anticoagulantes, geralmente indicados para pessoas em maior risco de problemas cardíacos, como heparina, varfarina e rivaroxabana, também podem aumentar o risco da dengue, já que interferem no processo de coagulação do sangue.
— No entanto, são casos em que os tratamentos não podem ser interrompidos, então é importante que o paciente busque o médico imediatamente no caso de suspeita ou confirmação de dengue. Será preciso um monitoramento mais de perto da quantidade de plaquetas e pode haver um ajuste na medicação — explica a especialista.
Qual remédio pode tomar com dengue?
No geral, a orientação no caso de suspeita, ou de confirmação de dengue, é que a preferência seja pelos analgésicos dipirona e paracetamol, que não interferem como os outros no risco de sangramento. Eles podem ser importantes porque, como não há tratamento específico para a dengue, as recomendações envolvem repouso, hidratação e eventualmente o uso de um dos dois medicamentos para aliviar febre ou dores.
— Só tem um alerta em relação ao paracetamol. Apesar de ser um excelente medicamento, deve ser usado com orientação médica porque doses muito elevadas podem ter um ação colateral no fígado, e a dengue também pode afetar o fígado — lembra Gonçalves.
Ela destaca que, em todos os casos, embora sejam medicamentos que fazem parte do cotidiano de muitas pessoas, o ideal é sempre buscar a orientação de um profissional como o médico ou o farmacêutico e evitar a automedicação:
— Por mais que sejam medicamentos que não precisam de receita, sempre há riscos. Por isso não recomendamos o uso prolongado dos medicamentos ou excessivo. O ideal é que o uso seja feito apenas após a avaliação de um profissional. Se houver suspeita de dengue, por exemplo, ele não vai indicar nenhum desses remédios que aumentam o risco. O paciente deve sempre procurar ajuda e explicar os sintomas.
Alta da dengue
Segundo o último informe da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde, o Brasil registrou 243.720 casos de dengue nas quatro primeiras semanas epidemiológicas de 2024, o que revela uma alta de 273%.
O crescimento chama atenção especialmente pelos aumentos já alarmantes nos últimos dois anos. Em 2023, o país bateu o recorde de mais mortes causadas pela doença. Foram 1.094 óbitos confirmados, o que superou o ano anterior, 2022, quando contabilizou 1.053 vidas perdidas.
Em relação aos casos, os dados do Ministério da Saúde mostram que foram 1.658.816 diagnósticos prováveis da infecção pelo vírus em 2023, 52.871 com evolução para hospitalização. O número é mais baixo apenas que 2015, quando o Brasil atingiu o recorde de 1.688.688 casos de dengue.
Vacinação contra a dengue
O Ministério da Saúde anunciou recentemente que 521 cidades receberão unidades da vacina contra a dengue Qdenga, da farmacêutica japonesa Takeda, para a campanha de 2024 na rede pública, primeira do mundo com o imunizante.
Devido ao quantitativo limitado de doses que o laboratório consegue produzir, nesse primeiro momento foram priorizados jovens de 10 a 14 anos residentes de municípios com mais de 100 mil habitantes e alta transmissão de dengue. A previsão é que a campanha comece neste mês.
A vacina também pode ser encontrada na rede privada por valores que vão de R$ 350 a R$ 490 a dose, segundo levantamento do GLOBO. Como o esquema envolve duas aplicações, com um intervalo de três meses entre elas, o preço final fica de R$ 700 a R$ 980.
A Qdenga foi aprovada pela Anvisa em março de 2023 para pessoas entre 4 e 60 anos. Nos estudos clínicos, o esquema de duas doses, aplicadas num intervalo de três meses entre elas, demonstrou uma eficácia geral de 80,2% para evitar contaminações, e de 90,4% para prevenir casos graves.
Recentemente, o Instituto Butantan publicou dados da última etapa dos estudos do seu imunizante, aplicado em dose única e que poderá ser produzido no Brasil. A eficácia foi de 79,6% para proteger contra a infecção ao longo de um período de dois anos, semelhante à da Qdenga.
A expectativa do Butantan é submeter o pedido de aprovação para uso à Anvisa neste ano para, se receber o sinal verde, a dose ser disponibilizada a partir de 2025.